Com uma delegação de 16 elementos, Angola apresentou-se no dia 29 de Outubro passado, em Banjul, Gâmbia, na 63.ª Sessão Ordinária da Comissão Africana dos Direitos Humanos, comum relatório considerado “desequilibrado e insuficiente”.
Os comissários não pouparam críticas e apontaram falhas. As organizações da Sociedade Civil Angolana denotaram o cariz demasiado político do relatório, que incluía slogans partidários.
No quinto dia, Angola expôs um relatório que segundo os comissários, não espelha a realidade do país.
A ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, Victória Francisco Correia da Conceição, leu durante pouco mais de uma hora, o relatório conjunto que Angola desenvolveu para dar respostas às recomendações feitas na última sessão da Comissão Africana dos Direitos Humanos.
Ao assistir à leitura em Banjul, Lúcia da Silveira, presidente da Associação Justiça Paz e Democracia (AJPD), defendeu logo à partida que “para apresentar um relatório desta importância, é necessário alguém que interaja com o mecanismo, o ministro da Justiça ou ministro das Relações Exteriores, até para dar importância ao sistema e mostrar que de facto existe seriedade por parte de Angola. A ministra da Família e Promoção da Mulher não está em condição de dar resposta às questões colocadas pela Comissão Africana dos Direitos Humanos, simplesmente vai ler as respostas e os comissários vão acabar por perceber que não tem o domínio sobre os assuntos. Tal como já ouvimos, a ministra leu o relatório que se revelou vazio,sem conteúdo e informações…”
“Há um desequilíbrio relativamente ao facto das recomendações não terem sido respondidas artigo por artigo. O relatório deve ser melhorado, não apresenta de forma prática as recomendações e os dados não espelham da realidade”, frisou a presidente da Comissão Africana dos Direitos Humanos, Maître Soyata Maiga, após a leitura do relatório.
Sete outros comissários levantaram de seguida uma série de questões sectoriais que não foram respondidas e todos, de um modo geral, exigiram dados que espelhem a realidade do país e demonstrem o impacto dos programas e leis na vida da população.
Depois de ouvir as críticas dos comissários, Ana Celeste Januário, secretária de Estado para os Direitos Humanos e Cidadania, reagiu dizendo que “é verdade que há uma série de questões de procedimentos e de respostas, como deve imaginar falar de um trabalho de um país desde 2012 até 2018, é muito e isso ia dar muitas páginas. Quando se resume nem sempre se diz tudo ou se define quais são as prioridades, mas estamos bastante tranquilos e temos a certeza que este diálogo é o momento para podermos apresentar à Comissão aquilo que fizemos em termos de avanço e também poder trazer aportes, informações que não tinha”.
De acordo com as organizações da Sociedade Civil, o governo deu prioridade à política. Hermenegildo Teotónio,advogado do Mosaiko – Instituto para a Cidadania, admitiu que “tendo em conta os novos ventos da governação Angolana, esperávamos talvez que o relatório reflectisse aquilo que é a realidade sobre os direitos humanos no país, mas neste sentido foi negativo, mostrou uma realidade que ainda está muito distante de Angola”.
Já Lúcia da Silveira da AJPD considerou que “o problema é que os Estados continuam a fazer da relatoria uma questão política, o relatório de Angola parece que foi escrita por um filósofo.Se existe efectivamente uma vontade séria de reportar sobre como se está a implementar a Carta Africana, é necessário seguir as regras, são simples, não há politiquices, é tudo muito técnico. Aliás, o relatório precisa ser feito por técnicos, pessoas que entendem e aprenderam sobre direitos humanos.”.
Habituados a discursar sobretudo sobre os progressos do país, a delegação Angolana composta também por representantes da Procuradoria-Geral da República, dos Ministérios das Relações Exteriores, Interior, Educação, Saúde, Cultura, Justiça e Direitos Humanos, Acção Social, Família e Promoção da Mulher e do Instituto Nacional da Criança. Voltou a não acertar, na feitura desta vez de um relatório combinado, 6.º e 7.º relatórios, relativo à implementação da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e os Direitos da Mulher em África.
A presidente da Comissão Africana dos Direitos Humanos apontou erros de estrutura, já que o relatório deveria obedecer a uma disposição que deveria percorrer cada artigo da carta, referir os desafios da implementação no país e o impacto ou efeitos sobre a população.
“Organizações como Mosaiko, AJPD, Omunga e outras, reiteradas vezes, chamamos à atenção do Estado Angolano de que é preciso envolver as pessoas, as organizações na feitura do relatório, mas não nos ouvem, só isto cai mal junto das organizações regionais. Esta não foi, infelizmente a primeira vez. Já no relatório anterior foram feitas as mesmas críticas”, sublinhou Hermenegildo Teotónio do Mosaiko.
Ana Celeste Januário explicou entretanto que “o que aconteceu foi, como tínhamos limitação de páginas,priorizamos as respostas directas às recomendações e não tanto a avaliar como é que o Estado está relativamente a cada um dos artigos. Quando há limite de páginas, limite de palavras, temos que optar o que vamos priorizar e priorizamos as respostas às recomendações”.
Entre menções aos protocolos e convenções internacionais e regionais ratificados, a eleição do Presidente João Lourenço, apesar da limitação, houve espaço para incluir que “o Governo Angolano tem uma estratégia de desenvolvimento de longo prazo, Angola 2025, que começou a ser executada através de planos anuais e bianuais para implementação do mandato do Governo foi elaborado o programa para o período de 2018-2022 denominado Melhorar o que está bem e corrigir o que está mal, o plano de Desenvolvimento Nacional, contém 229 acções transversais, entre estes 25 políticas que uma vez atingidas, melhorarão de certeza a vida dos cidadãos”, leu a ministra.
"Há muitos documentos e instrumentos que ensinam como fazer um relatório.Inclusive a AJPD publicou um roadmap que explica como os governos devem fazer para ter um relatório de qualidade ao invés de fazerem apenas uma reportagem sobre as boas práticas do governo. Há necessidade de evoluir e nós estamos sempre abertos a trabalhar com o governo”, assegurou Lúcia da Silveira.